Qual a Uberlândia dos próximos 129 anos?

Publicado nos jornais Diário do Comércio e Gazeta de Uberlândia em 01/09/2017

No longo prazo todos estaremos mortos

A frase acima foi proferida por Jonh Maynard Keynes em seu Tratado sobre reforma monetária de 1923. Me permito uma descontextualização da frase de Lorde Keynes para propor ao leitor uma reflexão, como sociedade, onde Uberlândia deseja estar no longo prazo? O futuro que nos aguarda será, por inércia, melhor do que o presente? A resposta desta pergunta não é trivial, e perpassa necessariamente por um diagnóstico do presente. Estamos hoje, melhor do que ontem?

Por dever de ofício, me atrevo a tentar responder este conjunto de questões a partir da métrica puramente econômica, me abstendo de comentar fatores morais, sociais e culturais que eventualmente, tenham evoluído (ou não). Sob o ponto de vista puramente material, Uberlândia está regredindo e mudanças são necessárias para incorporá-la novamente em um ciclo de desenvolvimento civilizatório.

A primeira preocupação quanto ao desenvolvimento econômico local, diz respeito ao mercado de trabalho, e ao observá-lo, o município vive um nítido retrocesso. Desde 2015 até julho de 2017 o município perdeu 6.127 vagas de trabalho, apresentando hoje, um total de 192.307 trabalhadores no mercado formal de trabalho, número muito aquém das necessidades de um município de 676 mil habitantes, e com uma População Economicamente Ativa de aproximadamente 416.750 pessoas. O contraste desta PEA com os empregos formais no município, mostram que se convive com um contingente de 224.443 aproximadamente na informalidade e no subemprego.

Uma população informal maior do que a população total de qualquer município da região, é um dado alarmante, e impacta diretamente no nível de renda local. Dada a dificuldade de se conhecer o número do PIB (comumente utilizado para auferir volume de riqueza social, mas que no caso dos municípios é divulgado apenas com 3 anos de defasagem), é possível verificar que a renda em Uberlândia está estagnada, verificando a massa salarial municipal em termos per capita, estagnada desde 2010 em algo próximo de 0,9 salários mínimos (número referente a dez/2015).

A grande questão é, onde Uberlândia estará no longo prazo? Fazendo as contas, pelas estimativas populacionais recentes do IBGE, a população de Uberlândia cresceu a uma taxa anual de 1,53% entre 2010 e 17. Considerando que esta taxa se mantenha constante na próxima década, o município chegará a 2027 com uma população aproximada de 787 mil habitantes, com um agravante, a população com idade superior aos 60 anos que em 2010 era de aproximadamente 62 mil habitantes, em 2017 será de aproximadamente 120 mil pessoas, quase o dobro. Isto significa basicamente que a partir da próxima década, a população em idade inativa do município, irá crescer acima da PEA que passará dos atuais 416 mil habitantes para algo próximo de 430 mil.

Isto naturalmente cria algumas novidades no cenário sócio econômico local:

1- a primeira delas é que, visto que a massa salarial per capita do município está estagnada desde 2010, esta população de quase 63 mil novos idosos que surgirão a partir da próxima década, serão em média, relativamente mais pobres do que os que ingressaram nesta faixa etária em décadas anteriores.

2- a riqueza criada a partir de então, deverá ser feita por um contingente de pessoas menor em termos relativos ao total da população, ou seja, o processo de criação de riqueza a ser distribuída localmente por vias de políticas públicas, será feito por um percentual de trabalhadores em proporção a população total, menor em relação ao que foi verificado até aqui. E finalmente,

3- isto irá naturalmente sobrecarregar vários dos serviços públicos locais, sobretudo a saúde e a assistência social, outros serviços deverão surgir como políticas públicas naturais de sociedades mais velhas, e o orçamento local, atualmente deficitário, enrigecido e organizado da forma tal qual a conhecemos, estará preparado para tanto? Esta pergunta apenas os anos e as atitudes do presente, poderão responder.

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1 comentário

  • Gilberto Neves

    A interessante pergunta do articulista sobre a Uberlândia dos próximos 129 anos chamou minha atenção para a leitura do artigo. De cara, a citação de Keynes já avisou que não teria respostas à pergunta do título. Por fim, ele esclareceu que abordaria a pergunta sob o aspecto econômico. Especificamente, ele tratou do encolhimento crescente da mão de obra empregada proporcionalmente à PEA e à população idosa. Seus dados apontaram uma realidade intrigante. Muito preocupante. Eu agregaria dois elementos para complicar a pergunta: novas tecnologias que diminuirão ainda mais a mão de obra empregada (não tão compensada pelo empreendedorismo virtual) e a redução das políticas sociais (que o digam o congelamento dos orçamentos/PEC 55 por 20 anos).
    Mais envelhecimento e menos empregos são dois dos elementos a refletir. No inverso, que lugar haverá para a juventude que vem chegando e não encontra perspectivas? Sem dúvidas, a vida modificada pelas novas tecnologias, internet e virtualidade será bem mais profunda do que já vimos até aqui. O padrão de vida, trabalho e relações sociais indicam possibilidades de mais desigualdades. A renda per capita citada pelo articulista abaixo de um salário mínimo é uma tendência, não um acidente de percurso.
    Em face destes preocupantes sintomas, o que o governo local, as universidades, forças econômicas, movimentos sociais e partidos políticos estão propondo? Mais perguntas precisam ser feitas e mais pessoas precisam cutucar as consciências para produzir uma ebulição cultural. Se conseguirmos alcançar resposta para duas ou três gerações já será bastante positiva. Daqui 129 anos? Estaremos todos mortos, mas espero que nossos tataranetos tenham uma vida melhor que a atual.

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