O Trilema dos Bancos Centrais

Publicado no Jornal Estado de São Paulo em 14/09/2022

No dia 04/05 houve elevações nos juros nos EUA e Brasil. Os Bancos Centrais (BCs) no mundo estão pondo fim na década do Zero Lower Bounds, quando estímulos monetários via Quantitative Easing e juros nominais próximos a 0% afastaram o risco da deflação.

No último ano, graças aos efeitos da Covid sobre atividades produtivas, a inflação acelerou antes do PIB convergir às suas taxas naturais. Em modelos tradicionais, os BCs perseguem o duplo mandato mirando a inflação e o hiato do produto. Porém, influenciar o PIB nem sempre é possível e isso depende do formato da curva de Phillips (CPh).

Sob expectativas adaptativas a CPh é inclinada e os preços partem da inflação passada. Ganhos no PIB são possíveis a curto prazo, mas não no longo. Já sob expectativas racionais a CPh torna-se vertical após estímulos monetários surpresas. Os BCs perdem reputação, a partir daí emissão de moeda causa inflação.

A longo prazo a política monetária é eficaz como âncora inflacionária, mas é inócua no que tange o PIB. Se as expectativas definem a inflação, os BCs têm de lidar com a inconsistência dinâmica da política monetária. Sua reputação depende do histórico de desvios da inflação em relação à meta. Em jogos sequenciais, quanto mais rodadas o BC cumpre a meta, mais crível e eficaz é a política monetária. Se o BC é crível, a contração monetária para arrefecer a inflação é menor, os BCs tomam medidas não contracionistas como forward guidance. No jargão militar, BCs usam seu poder de dissuasão para frear os preços.

Após 2008 os BCs passaram a monitorar também os preços de ativos nos mercados de capitais. Isso sobrecarregou a política monetária que passou a perseguir um triplo mandato. Eis o motivo pelo qual os BCs têm andado tanto tempo atrás da curva. Há a preocupação com a depreciação de ativos e o mergulho noutra recessão. Até aqui, os BCs foram eficientes em afastar tais riscos.

A missão dos BCs não é trivial e eles não serão capazes de mirar três objetivos municiados só com a taxa de juros. De imediato eles têm abdicado da meta de inflação. Por quanto tempo esta estratégia irá funcionar? Como dito, influenciar o PIB depende da CPh. Quanto aos preços dos ativos eles dependem, ceteris paribus, de informações que influenciam a psicologia social e podem flutuar independentes dos juros. Os BCs estão expostos a um trilema e tentando calibrar a política monetária minorando custos. Está claro, no entanto, que enfrentar tal trilema munidos exclusivamente da taxa de juros será uma missão inglória.

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