Publicado no Jornal Diário de Uberlândia em 18/09/2021
O país vem passando, já a alguns anos, por uma longa crise econômica que mais recentemente tomou também, contornos de uma crise social. Uberlândia, neste contexto, vêm acompanhando o desempenho econômico sofrível do restante do Brasil. O Livro Perspectivas de Desenvolvimento no Município de Uberlândia: Uma Análise Econômica, Social e das Finanças Públicas que lancei pela Fundação Astrojildo Pereira, faz uma aprofundada análise deste desempenho, sob inúmeros aspectos. No artigo de hoje, irei me debruçar sobre um dos pontos abordados no livro, a questão do mercado local de trabalho.
Esta questão está abordada no Capítulo 2 do Livro. Os dados compilados por mais de uma década, mostram inúmeros gargalos do mercado local de trabalho, o primeiro deles, é um grande contingente de pessoas no mercado informal de trabalho municipal. Considerando a população adulta entre 20 e 60 anos, existem hoje no município pouco mais de 400 mil pessoas nesta faixa etária, porém, quando se analisa os dados do Ministério do Trabalho, apenas cerca de 210 mil trabalhadores estão alocados em empregos com carteira assinada. Ou seja, quase 50% da força de trabalho no município está no mercado informal de trabalho.
O grande problema deste tipo de uma elevada proporção de trabalhadores informais no total da força de trabalho, é que estes trabalhadores estão alheios de quaisquer direitos, garantias, e seguridade sociais. Isso significa que se este trabalhador perder o emprego, grandes são as chances de ele cair na pobreza ou na miséria e passar a depender de programas assistenciais como o Bolsa Família. Não há contribuição para a previdência, direito ao seguro desemprego, ou ao fundo de garantia (FGTS), em outras palavras, os trabalhadores informais dependem exclusivamente da sua força de trabalho para sobreviver. O meu livro, bem como os dados que ele apresenta, foram concebidos antes da pandemia do Coronavírus. Quando se estudo municípios, os dados quase sempre vêm com alguma defasagem na divulgação, portanto, a situação já era crítica antes da pandemia e hoje beira a calamidade. Não é preciso ler meu livro para constatar o volume da informalidade no município, basta parar nos sinaleiros das mais variadas regiões da cidade e tirar a prova.
Mas a informalidade não é o único fator crítico do mercado de trabalho local. Mesmo entre os trabalhadores formais, os problemas já começam a aparecer. Em 2018, cerca de 74% dos trabalhadores com carteira assinada em Uberlândia, estavam alocados em empregos no setor de comércio e serviços. O comércio físico, presencial, tal qual é conhecido do público vinha passando pela revolução silenciosa dos algoritmos e migrando para o comércio digital. O Livro aponta essa tendência que é anterior ao COVID-19, mas que agora foi acelerada pelas novas relações de compras online intensificadas pela pandemia. Esse processo de digitalização do comércio, já adiantado em grandes empresas de varejo e que deve se consolidar em breve nas pequenas, vai exigir menos presença de mão de obra nesse setor e expulsar trabalhadores do comércio para outros setores, ou para a própria informalidade.
O setor de serviços, por sua vez, é bastante heterogêneo, contempla desde barbearias, até bancos e serviços intelectuais densos da área da saúde, e tecnologia da informação. O trabalhador de Uberlândia, em 2018 é em média mais educado do que o era em 2005. Enquanto os trabalhadores que não completaram o ensino fundamental caíram de cerca de 20% do total para menos de 10% neste período, os com ensino superior ou pós-graduação fizeram o percurso inverso, saltaram de cerca de 15 mil trabalhadores para 40 mil entre 2005 e 2018. Porém, ainda assim, a maior parte dos trabalhadores neste setor de serviços, está empregada em serviços de baixa qualificação, baixa produtividade e, portanto, baixos salários.
Meu livro explica que a predominância de trabalhadores alocados em setores de baixa produtividade como comércio e serviços está por trás do comportamento verificado da massa salarial agregada no município, que vem em queda desde 2014. Dado que a população cresce, os trabalhadores também crescem, a massa salarial per capita apresenta queda ainda mais intensa. Em 2005 um trabalhador empregado no mercado formal no município, recebia em média um salário de 3,1 salários mínimos, em 2018, este mesmo trabalhador recebe cerca de 2,6 salários mínimos. Ainda que o salário mínimo tenha apresentado ganhos reais neste período, é indiscutível que o trabalhador uberlandense tem hoje, na média, um salário menor do que tinha no passado, e as estimativas feitas para os próximos anos, é que a massa salarial per capita caia para menos de 2 salários mínimos.
Este comportamento, faz com que aproximadamente metade dos trabalhadores com carteira assinada, isto é, cerca de 100 mil trabalhadores, no município recebam até 2 salários mínimos. Se o leitor se lembrar que outros quase 200 mil trabalhadores estão fora do mercado formal de trabalho e, portanto, não recebem nem isso. É possível entender que a Uberlândia está se tornando uma cidade de renda predominantemente baixa e isto configura como um entrave à demanda, aos negócios e à riqueza local como um todo. A boa notícia é que há um enorme espaço para melhorar, propostas para superar esse ambiente de estagnação e pobreza são discutidas na última parte do livro. Convido o leitor a fazer este percurso na economia da sua cidade.
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