É preciso debater a estabilidade no emprego público

Publicado no Jornal Diário do Comércio em 02/11/2017

No âmbito de uma crise fiscal que adentra no quarto ano de déficit primário do setor público, é preciso debater propostas. Após a PEC do teto dos gastos públicos e a reforma da previdência, que não resolverão (sozinhos) o problema fiscal, quais serão os próximos passos?

Enfrentar uma crise fiscal do tamanho da brasileira, significa rever alguns tabus que travestidos de forma equivocada (e oportunista) de direitos sociais. Um destes tabus que jamais foram contestados por décadas, é a estabilidade do emprego público, prevista no art. 41 da Constituição Federal, esta regra vem sendo nos últimos 30 anos, responsável por um conjunto de distorções na economia brasileira.

Um exemplo destas distorções, pode ser visto sob aspectos distributivos. Segundo o IBGE, o rendimento real médio efetivo de um trabalhador no setor público é de aproximadamente R$3.290, enquanto que no setor privado com carteira assinada este valor é R$2.020 e um trabalhador privado sem carteira assinada ganha em média R$1.200. Os dados da remuneração dos trabalhadores brasileiros, por tipo de ocupação, mostram a inexistência de um trade of entre estabilidade e remuneração no serviço público. Não faz sentido, do ponto de vista social que um trabalhador dotado de estabilidade no cargo de servidor público, ganhe em média tão mais que um trabalhador da iniciativa privada, cuja preocupação com o desemprego é recorrente.

Ademais, é possível perceber que a soma de estabilidade no cargo e remuneração sensivelmente maior, atrai trabalhadores com maior educação formal e, consequentemente, maior produtividade para as carreiras do Estado, segundo a RAIS em 2015 19% do emprego formal no Brasil estava no setor público. Isto perpetua no setor privado, a distribuição de trabalhadores em setores de menor produtividade. Em 2015, apenas 16% da força formal de trabalho no Brasil estava empregada na indústria de transformação, tida pelas leis de Kaldor (1989) como o setor de maior produtividade e, consequentemente, indutor do crescimento econômico. Em paralelo, 61% da força de trabalho no Brasil, trabalha nos setores do comércio, serviços e construção, tidos como de menor produtividade.

Se o gasto público com pessoal é questionável quando avaliado sob aspectos distributivos e de crescimento. No que se refere às soluções para a crise fiscal, trata-se de uma alternativa viável. Sobretudo no que se refere aos governos subnacionais, que segundo Tiebout (1956), são os responsáveis principais pela função alocativa do governo, graças as menores assimetrias de informação.

No que se refere aos estados, haviam em 2016, 17 governos estaduais descumprindo o limite legal da LRF, gastando acima dos 54% da receita nesta rubrica. Já no que se refere aos municípios, a situação é ainda mais dramática, levantamento recente da FIRJAN, mostra que em 2016 mais da metade (55,1% ou 2.503) das prefeituras brasileiras comprometeram mais de 50% da RCL com despesas de pessoal. Já a Confederação Nacional dos Municípios indica que 576 prefeituras estão pagando os salários de forma escalonada. Não há perspectiva de governos municipais e estaduais repassarem todo este passivo para a União.

Isto indica que em alguma medida, a estabilidade do emprego público precisará ser revista. No último dia 4/10, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, aprovou o texto da PLS 116/2017, de autoria da Senadora Maria do Carmo Alves (DEM-SE), o projeto prevê a regulamentação do art. 41, § 1º, III, da Constituição, que prevê demissão do servidor público cujo o desempenho seja considerado insatisfatório.

O projeto da senadora, prevê avaliação semestral, a ser realizada por um servidor de carreira que ocupe uma função de chefia no respectivo departamento, outorgando, portanto, uma função a ser desempenhada por níveis mais elevados da burocracia, em relação aos níveis menos elevados. Contudo isto precisa ser melhor discutido, já que posições hierárquicas são comumente revezadas no serviço público, isto pode criar duas situações indesejáveis:

1° O surgimento de um incentivo à formação de um conluio, uma espécie de logrolling da burocracia, onde há um acordo informal de não agressão entre servidores que se revezam na chefia. Ou ainda, o caso simetricamente oposto:

2° Por problemas pessoais de quaisquer naturezas, servidores de níveis hierárquicos maiores, perseguirem seletivamente servidores subalternos com critérios questionáveis de avaliação.

O fato é que o projeto em tramitação no Senado, se aprimorado, pode tornar um importante instrumento a favor da accountabillity. Mas a avaliação tem que se dar também por outros critérios. Um primeiro seria uma avaliação da sociedade civil, como avaliar o desempenho de um servidor público, sem consultar a razão dele existir? A segunda forma, avaliando inclusive os chefes da burocracia, trata-se de comparar o desempenho do setor frente aos planos, diretrizes e metas propostas pela respectiva área. Em geral, existem no Brasil planos e metas nacionais para quase tudo, educação; saneamento; saúde e etc… por que não vincular o desempenho do serviço público, ao alcance em tempo hábil destas metas propostas?

O momento é propício para rever tabus que alimentam privilégios à custa do orçamento público, e a aprovação do PSL, ajudará a equilibrar as contas públicas de Estados e Municípios, também a equalizar regras trabalhistas, sobretudo elevar a produtividade, a eficiência e a eficácia na gestão pública.

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